Mega secas tem se tornado mais frequentes e decastadoras

Um estudo recente publicado na revista científica Science revelou que as mega secas – períodos de seca que duram pelo menos dois anos – têm se tornado mais frequentes e devastadoras. A pesquisa analisou dados de 1980 a 2018, identificando mais de 13 mil eventos desse tipo no período. O Brasil apareceu duas vezes entre os dez casos mais graves.

Simone Fatichi, autor do estudo, explica: “Essas secas prolongadas não são exatamente um ‘evento meteorológico’. Elas ocorrem de forma mais sutil, ao longo de um período maior e em uma área mais extensa”. Ou seja, são períodos anômalos prolongados, caracterizados principalmente pela redução das chuvas.

Essa tendência é confirmada pelo mais recente relatório da Organização Meteorológica Mundial (OMM), publicado na última semana. Ele aponta a intensificação das secas no Brasil.


ENTENDA O IMPACTO DAS MEGA SECAS NO BRASIL

Nos últimos anos, o Brasil enfrentou a mega seca de 2024, que afetou quase 60% do território. Foi a mais intensa e generalizada da história. A situação foi agravada pelo aquecimento global, a deflorestação e eventos climáticos naturais, como o El Niño.

A seca impactou severamente a Amazônia e o Pantanal. Em 2023, o Pantanal perdeu 61% da sua área coberta por água, em comparação com a média histórica desde 1985. A Amazônia, por sua vez, enfrentou um recorde de seca, que se agravou em 2024, com um aumento de 2000% na área afetada por seca extrema.


DUAS REGIÕES BRASILEIRAS ENTRE AS MAIS ATINGIDAS

O estudo revela que a Amazônia Sul-Ocidental, abrangendo parte do Acre, Amazonas, Rondônia, Mato Grosso, Bolívia e Peru, enfrentou uma mega seca devastadora de 2010 a 2018. Essa região foi a 7ª mais grave do mundo nesse período. Durante os oito anos, rios como o Madeira, Negro e Solimões atingiram níveis historicamente baixos. As comunidades ribeirinhas ficaram isoladas.

A vegetação amazônica sofreu um estresse hídrico severo, aumentando a vulnerabilidade da floresta aos incêndios. Em 2015 e 2016, os focos de queimadas aumentaram até 30%.

Já na região Leste, o estudo identificou a seca de 2014 a 2017 como a 9ª mais severa do mundo. Ela afetou estados como Minas Gerais, Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Paulo. A crise hídrica atingiu a região mais populosa e economicamente ativa do país. O Sistema Cantareira, responsável por abastecer a Grande São Paulo, chegou a operar com “volume morto” em 2015, com menos de 5% de sua capacidade.


IMPACTOS DIVERSOS EM CADA CANTO DO MUNDO

De acordo com o estudo, três fatores principais estão contribuindo para o agravamento das mega secas: o aumento das temperaturas globais, a diminuição das chuvas e o aumento da evapotranspiração, que é o processo de transferência de água da Terra para a atmosfera. Nesse contexto, nas regiões mais quentes, a falta de chuvas se torna ainda mais intensa, agravando a situação. Por outro lado, nas áreas mais frias, o problema maior é a perda de água para a atmosfera, o que contribui para uma escassez ainda mais pronunciada.

No Brasil, biomas como o Cerrado e o Pampa sofreram mais com a perda de vegetação. A Amazônia mostrou maior resistência inicial. No entanto, a seca prolongada pode causar danos enormes e duradouros, como na Amazônia Sul-Ocidental.


PAÍS SOB PRESSÃO CRESCENTE

A OMM alertou, em seu relatório anual, que a seca afetou amplas áreas das Américas em 2023 e 2024. No Brasil, a estiagem foi mais intensa no interior da América do Sul. O Rio Negro, em Manaus, e o Rio Paraguai, em Assunção, atingiram níveis recordes de baixa.

Além disso, o número de incêndios na Amazônia foi o maior desde 2010, reflexo das condições extremas e das pressões humanas sobre o bioma. O Cemaden, em dezembro, confirmou que as secas no Brasil têm se tornado mais frequentes e severas desde os anos 1990, afetando biomas como a Amazônia, Pantanal e Cerrado.


ADAPTAÇÃO NECESSÁRIA

Com esses dados alarmantes, cientistas preveem secas mais severas no centro do país e no semiárido até 2060. Essas áreas já enfrentam pobreza e dependência da agricultura familiar, o que pode agravar o êxodo rural e aumentar disputas por recursos naturais.

Em 2024, mais da metade do território brasileiro sofreu com secas severas ou extremas, afetando diretamente 1.200 municípios. Para Alexandre Prado, líder em Mudanças Climáticas do WWF-Brasil, os impactos já são evidentes. Ele destaca: “As secas estão mais intensas e frequentes, além de ocorrerem mais cedo do que o previsto”.

O Cemaden está aprimorando métodos para monitorar os riscos da seca. No entanto, será imprescindível um esforço conjunto entre o governo, a sociedade civil, o setor privado e a comunidade científica. Somente por meio dessa colaboração será possível desenvolver soluções eficazes que ajudem o Brasil a se adaptar a secas mais frequentes e intensas.

“O planeta está adoecendo diante dos nossos olhos. Diante de todos esses dados e da vulnerabilidade de tantas regiões do Brasil, os últimos dois anos foram impressionantes. A situação exige uma resposta rápida e eficaz. Temos conhecimento, tecnologia e capacidade para agir. O desafio agora é transformar isso em ação concreta”, finaliza Prado.

1 comentário em “Mega secas tem se tornado mais frequentes e decastadoras”

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